A cadeira vazia na sala da Justiça
Enquanto o réu e o condenado são celebrados, as vítimas e seus parentes são esquecidos durante e após o processo judicial. Isso precisa mudar.
O terrorista Cesare Battisti foi preso nesse domingo na Bolívia. A expectativa é de que seja extraditado para a Itália, onde voltará a cumprir a pena de prisão perpétua à qual foi condenado, tendo permanecido impune no Brasil por anos graças às pirotecnias legais que cá abundam em favor dos criminosos.
Alguns “especialistas” (entre aspas mesmo) já se levantam contra o que seriam as agressões aos direitos humanos do aludido assassino. Unem-se a todo um cordão de políticos, artistas e personalidades de espectro mais à esquerda que sempre o apoiaram, a começar por um governo que o aceitou no Brasil com status de refugiado político, concedido pelo então ministro Tarso Genro, quando sempre foi um criminoso comum.
Enquanto esteve em nosso país, Battisti teve status de celebridade, participando, por exemplo, da abertura de um tal Fórum Social Temático, em 2012, lançando um livro e até mesmo sendo convidado para palestras.
Antonio Santoro, Lino Sabadin, Andrea Campagna, Pierluigi Torregiani, e Alberto Torregiani. Os quatro primeiros morreram pelas ações de Battisti. Já Alberto,filho de Pierluigi, ficou paraplégico no mesmo atentado que matara seu pai, e somente agora diz acreditar que acabou a fuga de seu algoz.
Todo o processo penal tem como protagonista o réu, mas no Brasil há uma hipérbole de direitos e garantias que são absolutamente incompatíveis com a lógica mais básica, que geram a sensação de impunidade e injustiça.
O criminoso possui todo um aparato mantido pelo próprio estado, ONGs, associações e a mídia para defendê-lo. Há uma ânsia em se proteger o vilão, o que tem gerado diariamente mais vilões.
E a vítima?
Se o processo penal é um palco onde o acusado brilha, esse tablado é construído com o sangue, os ossos e as lágrimas das vítimas e seus familiares. E, embora gigantesco, ninguém lhe presta atenção.
Não existem comissões de direitos humanos para as vítimas. Não há políticos, acadêmicos ou artistas que as visitem nos hospitais ou compareçam aos seus enterros. Ninguém lhes pergunta se precisam de algo, se o dinheiro roubado pelo bandido para “tirar uma onda” iria pagar a conta de luz e levar comida para um casebre.
A vítima, quando viva, é ouvida em audiência e só essa é sua participação, afinal, a ritualística penal não serve para observar os seus direitos.
Há uma solução bem econômica para reparar simbolicamente esse desprezo histórico: que nas delegacias, nas salas de audiência, nos julgamentos dos tribunais e, em especial, nos tribunais superiores, cujo contato com o processo limita-se às histórias contadas no papel e nas palavras dos advogados, houvesse sempre uma cadeira vazia.
Só isso. Uma cadeira simples, de madeira, mas que nunca tivesse outra finalidade que não permanecer no ambiente como uma lembrança de que o processo penal não é só sobre o acusado, mas também sobre a vítima.
Sua presença silenciosa agigantando-se para que todos se recordem que a compaixão para com o criminoso não deve ser maior do que a justiça devida à vítima.
Rui Barbosa, a quem muito aprecio citar, já dizia que “a justiça, cega para um dos dois lados, já não é justiça. Cumpre que enxergue por igual à direita e à esquerda”.
A sociedade e a vítima possuem direitos, não apenas o acusado. Um sistema legal que pretende ser justo garantirá o de todos, não apenas de um ou outro.
Battisti, se há um pouco de justiça no mundo, logo estará a caminho da Itália para cumprir sua pena postergada pela impunidade que grassa no Brasil, mas que já anuncia mudanças.
Quatro cadeiras vazias deveriam esperá-lo no aeroporto.
Uma única cadeira vazia também deveria estar nos cursos de Direito, nas redações jornalísticas, em todo lugar em que se pretenda defender a impunidade sob a falsa bandeira de justiça social.
A solitária cadeira, grande o suficiente para que nela coubessem as milhões de vítimas do desencarceramento, do laxismo penal e da bandidolatria.
Três contos sobre ofertar presentes podem nos dizer muito sobre o Natal.
Pensar o Natal como uma auditoria da nossa conduta no último ano e um ajuste de caminho para o ano vindouro o torna uma data sempre presente, e não um feriado no qual se come muito e se trocam presentes.